Vencer as 24 Horas de Le Mans é um feito notável. Além da perícia e do esforço hercúleo dos pilotos, também é preciso contar com a sorte durante os 1.440 minutos de corrida, uma equipe de box eficiente, além de um carro rápido, confiável e resistente. E a equipe Mazdaspeed reunia todos esses atributos, em torno do Mazda 787B.
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O lendário protótipo laranja e verde representou a consagração máxima da marca japonesa em Le Mans, após anos de tentativas na prova mais exigente do automobilismo. Entre 1983 e 1991, a fabricante japonesa inscreveu diversos protótipos equipados com seu exótico motor rotativo Wankel.
Depois de dois anos de aprendizado e uma obsessão em comprovar a durabilidade de seus motores Wankel, a Mazda chegou ao carro final para a temporada de 1985. O 737C se mostrou equilibrado e bastante competitivo.
O Mazda 787B foi a última evolução dos protótipos equipados com motores rotativos Wankel
O carro terminou a edição das 24 Horas de Le Mans nas terceira e sexta posições da classe C2, resultado que incentivou a continuidade do programa de corridas de longa duração. Além disso, os protótipos ajudavam a reforçar a imagem esportiva da marca, em um momento em que o RX-7, lançado no final dos anos 1970, acabava de estrear sua segunda geração.
Os anos seguintes, porém, foram difíceis. Os dois Mazda 757 inscritos em 1986 abandonaram por problemas de transmissão. Já os 767 e 767B, que competiram entre 1987 e 1989, tiveram como melhor resultado um nono lugar. Apesar de participarem de provas como os 500 km de Suzuka e as 24 Horas de Daytona, os carros da Mazda não conquistaram pódios neste período.
Um dos desafios era o consumo elevado. Embora leves, os protótipos também tinham potência inferior à de rivais como Porsche 956B e 962C, Jaguar XJR-9 e Sauber-Mercedes C9.
O Mazda 787 estreou em 1990 com o novo motor R26B, que substituiu o 13J-M. Ambos eram rotativos de quatro rotores, mas o R26B recebeu melhorias significativas, como novas entradas de ar e três velas por rotor. Em testes, a potência podia chegar a cerca de 900 cv. Dois carros foram inscritos em Le Mans 1990, mas ambos abandonaram por falhas mecânicas.
Para 1991, com mudanças no regulamento da FIA que privilegiavam motores 3,5 litros aspirados na Classe C1, o 787B foi enquadrado fora da categoria principal, beneficiando-se de um peso mínimo menor, de 830 kg. O carro passou por uma dieta rigorosa, com maior uso de kevlar e fibra de carbono, além de ganhar mais 2,2 cm de distância entre-eixos, que favoreceu o reposicionamento de componentes.
Mais leve e com potência ajustada para melhor eficiência em Le Mans, o 787B superou com facilidade os novos carros da Classe C1
O motor ganhou admissão de geometria variável, elevando o torque para cerca de 61 kgfm a 6.500 rpm. A rotação máxima foi limitada a aproximadamente 8.500 rpm para garantir confiabilidade, reduzindo a potência para cerca de 650 cv em configuração de corrida.
Abrir mão da potência se mostrava fundamental para tornar o carro mais eficiente, com menor consumo de gasolina, assim como maior durabilidade dos pneus e também dos freios. Afinal, quanto menos paradas nos boxes de Sarthe, melhor será a performance. O conjunto utilizava câmbio manual de cinco marchas fornecido pela Porsche.
A Mazda inscreveu três carros em Le Mans para edição de 1991 (dois 787 B, um 787, além de um quarto 787 como carro reserva), que largaram no segundo pelotão, atrás dos protótipos da Classe C1. A pole ficou com o Mercedes-Benz C11, seguido por Jaguar XJR-14 e Peugeot 905. O 787B número 55, pilotado por Johnny Herbert, Volker Weidler e Bertrand Gachot, largou no segundo pelotão.
Mais leve e resistente, o 787B era a última cartada da Mazda para vencer em Le Mans, mesmo com as probabilidades de vitória apontando para atual campeã Jaguar e dobradinha Sauber-Mercedes, que também levaram carros das edições passadas para completar o grid.
Circulavam rumores de que nem a Mercedes ou a Jaguar confiavam plenamente nos novos carros com motores V8 3.5 da Classe C1. E por isso levaram seus veteranos para aumentar as chances de sucesso.
Ao ficar sabendo da falta de confiança dos rivais, o chefe de equipe da Mazdaspeed mudou sua estratégia. Ao invés de fazer uma prova comedida, com foco na finalização e comprovação da resistência de seus Wankel, surgiu uma oportunidade de aposentar o protótipo com chave de ouro. Assim, a regra era levar o carro ao máximo, uma vez que os carros com novos motor 3.5 litros ainda não estavam em sua plenitude de desenvolvimento. Ou seja, a estratégia era forçar a fadiga do inimigo.
Motor 2.6 de quatro rotores poderia superar os 900 cv, mas foi ajustado para cerca de 650 cv para reduzir desgastes de freios, pneus e consumo de gasolina
Economia de combustível não era prioridade naquele momento. E a ordem foi cumprida, não demorou muitas voltas para que 787 B (número 55) saltasse para a terceira posição. O carro conduzido pelo trio Johnny Herbert, Volker Weidler, Bertrand Gachot voava baixo na Mulsanne.
A vantagem sobre os carros da C1 se confirmou e os novos protótipos com motores 3.5 V8 caíam como moscas. Forçar os novos carros foi uma estratégia assertiva. A Mazda manteve o ritmo do carro 55, que completou a prova com 362 voltas, duas à frente do veterano Jaguar XJR-12.
Os carros de números 18 e 56 finalizaram a prova nas sexta e oitava posições gerais. Entre os pilotos estava o brasileiro Maurizio Sandro Sala. Assim, depois de oito anos de persistência a Mazda venceu em Le Mans dando ao 787B sua única e inesquecível vitória.
A vitória, porém, veio no último ano permitido. A partir de 1992, motores rotativos e turbo foram proibidos no Mundial de Carros Esportivos. Mesmo com apenas um triunfo, o Mazda 787B tornou-se um ícone do automobilismo, lembrado até hoje como o único carro com motor rotativo a vencer Le Mans, assim como a primeira marca japonesa a conquistar o pódio francês. Parece até história de cinema.
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O lendário protótipo laranja e verde representou a consagração máxima da marca japonesa em Le Mans, após anos de tentativas na prova mais exigente do automobilismo. Entre 1983 e 1991, a fabricante japonesa inscreveu diversos protótipos equipados com seu exótico motor rotativo Wankel.
A evolução da Mazda em Le Mans
Depois de dois anos de aprendizado e uma obsessão em comprovar a durabilidade de seus motores Wankel, a Mazda chegou ao carro final para a temporada de 1985. O 737C se mostrou equilibrado e bastante competitivo.
O Mazda 787B foi a última evolução dos protótipos equipados com motores rotativos Wankel
O carro terminou a edição das 24 Horas de Le Mans nas terceira e sexta posições da classe C2, resultado que incentivou a continuidade do programa de corridas de longa duração. Além disso, os protótipos ajudavam a reforçar a imagem esportiva da marca, em um momento em que o RX-7, lançado no final dos anos 1970, acabava de estrear sua segunda geração.
Os anos seguintes, porém, foram difíceis. Os dois Mazda 757 inscritos em 1986 abandonaram por problemas de transmissão. Já os 767 e 767B, que competiram entre 1987 e 1989, tiveram como melhor resultado um nono lugar. Apesar de participarem de provas como os 500 km de Suzuka e as 24 Horas de Daytona, os carros da Mazda não conquistaram pódios neste período.
Um dos desafios era o consumo elevado. Embora leves, os protótipos também tinham potência inferior à de rivais como Porsche 956B e 962C, Jaguar XJR-9 e Sauber-Mercedes C9.
O Mazda 787 estreou em 1990 com o novo motor R26B, que substituiu o 13J-M. Ambos eram rotativos de quatro rotores, mas o R26B recebeu melhorias significativas, como novas entradas de ar e três velas por rotor. Em testes, a potência podia chegar a cerca de 900 cv. Dois carros foram inscritos em Le Mans 1990, mas ambos abandonaram por falhas mecânicas.
O ano do Mazda 787B
Para 1991, com mudanças no regulamento da FIA que privilegiavam motores 3,5 litros aspirados na Classe C1, o 787B foi enquadrado fora da categoria principal, beneficiando-se de um peso mínimo menor, de 830 kg. O carro passou por uma dieta rigorosa, com maior uso de kevlar e fibra de carbono, além de ganhar mais 2,2 cm de distância entre-eixos, que favoreceu o reposicionamento de componentes.
Mais leve e com potência ajustada para melhor eficiência em Le Mans, o 787B superou com facilidade os novos carros da Classe C1
O motor ganhou admissão de geometria variável, elevando o torque para cerca de 61 kgfm a 6.500 rpm. A rotação máxima foi limitada a aproximadamente 8.500 rpm para garantir confiabilidade, reduzindo a potência para cerca de 650 cv em configuração de corrida.
Abrir mão da potência se mostrava fundamental para tornar o carro mais eficiente, com menor consumo de gasolina, assim como maior durabilidade dos pneus e também dos freios. Afinal, quanto menos paradas nos boxes de Sarthe, melhor será a performance. O conjunto utilizava câmbio manual de cinco marchas fornecido pela Porsche.
A Mazda inscreveu três carros em Le Mans para edição de 1991 (dois 787 B, um 787, além de um quarto 787 como carro reserva), que largaram no segundo pelotão, atrás dos protótipos da Classe C1. A pole ficou com o Mercedes-Benz C11, seguido por Jaguar XJR-14 e Peugeot 905. O 787B número 55, pilotado por Johnny Herbert, Volker Weidler e Bertrand Gachot, largou no segundo pelotão.
Mais leve e resistente, o 787B era a última cartada da Mazda para vencer em Le Mans, mesmo com as probabilidades de vitória apontando para atual campeã Jaguar e dobradinha Sauber-Mercedes, que também levaram carros das edições passadas para completar o grid.
Circulavam rumores de que nem a Mercedes ou a Jaguar confiavam plenamente nos novos carros com motores V8 3.5 da Classe C1. E por isso levaram seus veteranos para aumentar as chances de sucesso.
Mudança de planos
Ao ficar sabendo da falta de confiança dos rivais, o chefe de equipe da Mazdaspeed mudou sua estratégia. Ao invés de fazer uma prova comedida, com foco na finalização e comprovação da resistência de seus Wankel, surgiu uma oportunidade de aposentar o protótipo com chave de ouro. Assim, a regra era levar o carro ao máximo, uma vez que os carros com novos motor 3.5 litros ainda não estavam em sua plenitude de desenvolvimento. Ou seja, a estratégia era forçar a fadiga do inimigo.
Motor 2.6 de quatro rotores poderia superar os 900 cv, mas foi ajustado para cerca de 650 cv para reduzir desgastes de freios, pneus e consumo de gasolina
Economia de combustível não era prioridade naquele momento. E a ordem foi cumprida, não demorou muitas voltas para que 787 B (número 55) saltasse para a terceira posição. O carro conduzido pelo trio Johnny Herbert, Volker Weidler, Bertrand Gachot voava baixo na Mulsanne.
A vantagem sobre os carros da C1 se confirmou e os novos protótipos com motores 3.5 V8 caíam como moscas. Forçar os novos carros foi uma estratégia assertiva. A Mazda manteve o ritmo do carro 55, que completou a prova com 362 voltas, duas à frente do veterano Jaguar XJR-12.
Os carros de números 18 e 56 finalizaram a prova nas sexta e oitava posições gerais. Entre os pilotos estava o brasileiro Maurizio Sandro Sala. Assim, depois de oito anos de persistência a Mazda venceu em Le Mans dando ao 787B sua única e inesquecível vitória.
A vitória, porém, veio no último ano permitido. A partir de 1992, motores rotativos e turbo foram proibidos no Mundial de Carros Esportivos. Mesmo com apenas um triunfo, o Mazda 787B tornou-se um ícone do automobilismo, lembrado até hoje como o único carro com motor rotativo a vencer Le Mans, assim como a primeira marca japonesa a conquistar o pódio francês. Parece até história de cinema.
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